Seria necessário maior espaço
para expormos
convenientemente o tema
proposto, pela sua abrangência,
profundidade e influência.
Mas desejamos fazer algumas observações
importantes
para, dessa forma, estimular os leitores a ler e estudar João Calvino.
João Calvino é uma figura não só controversa, mas ainda
muito desconhecida e mal compreendida por muitos. Nesta
data importante para os calvinistas de todo o mundo, não
é exagero afirmar que a história da teologia pode ser
dividida em pré e pós João Calvino, devido ao seu legado
teológico. A abrangência e influência de seu pensamento
fazem dele um dos principais teólogos de todos os tempos
da Igreja Cristã.
Foi a mente brilhante de João Calvino que cristalizou a
Reforma Protestante. O calvinismo não foi um movimento
teológico passageiro. É impossível fazer teologia de
modo responsável sem interagir com o legado de Calvino.
O calvinismo é um modo completo de ver, entender e
existir; é um sistema que envolve todos os aspectos da
vida humana.
Embora a concepção popular do pensamento teológico de
Calvino seja a de um sistema rigorosamente lógico,
centrado sobre a doutrina da predestinação, isto não é
verdade. Falar de Calvino como um teólogo sistematizador
implica em um grau de afinidade com o escolasticismo
medieval que contradiz suas atitudes conhecidas. Também
sugere um deslocamento significativo entre Calvino e sua
cultura, que não percebeu que nenhuma razão particular para produzir obras de
“teologia sistemática” – um gênero literário que, de
qualquer modo, estava firmemente identificado com a
preservação do tão desprezado escolasticismo.
A obra teológica de Calvino
A obra magna da exposição do pensamento teológico de
João Calvino é conhecida pelo nome de As Institutas.
Em importância, influência e qualidade, essa obra não
possui rival na história da teologia. Ela poderia ser
comparada, talvez, à Cidade de Deus de Agostinho,
ou a Summa de Tomás de Aquino, possivelmente à Dogmática Eclesiástica de Karl Barth.
Entretanto, a todas essas a obra-prima de Calvino supera.
As
Institutas são um livro onde encontramos não apenas o melhor compêndio de teologia
cristã, segundo alguns teólogos, mas também a base de
uma cosmovisão cristã, cuja abrangência e consistência
são sem igual na história da igreja. Ele ainda produziu
comentários sobre quase todos os livros do Novo
Testamento (exceto 2 e 3 João e Apocalipse) e, no
Antigo, escreveu sobre o Pentateuco, Josué, Salmos e
sobre os profetas maiores e menores (Isaías e
Malaquias). A série Corpus Reformatorum contém
872 sermões de Calvino.
A biblioteca de Genebra possui
2035 desses sermões em manuscrito. Ele também publicou
folhetos e tratados com temas apologéticos (contra
católicos e anabatistas) e de assuntos gerais sobre a
Reforma da Igreja. Um dos mais conhecidos é o tratado
sobre a Ceia do Senhor (escrito quando estava em
Estrasburgo), em que combate os pontos de vista do
romanismo e do luteranismo e dá o seu próprio ponto de
vista sobre a ordenança.
Através de cartas se comunicou
com outros reformadores, soberanos, igrejas perseguidas
e protestantes encarcerados, pastores, colportores, e
outros.
Uma das mais famosas de suas cartas, além da que
prefacia a sua obra magna, dirigida ao rei Francisco I,
é sua resposta ao cardeal Sadoleto. Este ícone da
teologia cristã ainda produziu escritos litúrgicos e
catequéticos. Logo depois da 1ª edição das Institutas,
Calvino escreveu o seu primeiro “catecismo” a que deu o
nome de Instrução de Fé, em 1537, que verteu para o
francês em 1538. Em Genebra, escreveu também com outro
catecismo, ao qual deu o formato de catecismo mesmo,
hoje conhecido como o Catecismo de Genebra. Ali escreveu
também uma Confissão de Fé, livro de ordem litúrgica e
administração eclesiástica (disciplina), saltério, etc.
Pelo volume de seus escritos se percebe a profundidade
de seu pensamento. É certo que as Institutas,
obra publicada em sua versão final em 1559, têm sido
frequentemente comparadas às outras obras, com suas 512
questões, 2.669 artigos e mais de 10.000 objeções e
réplicas - em sua abrangência e influência. Mas isto é
confundir puro volume literário e influência histórica
com afinidade teológica.
Como um estudo da evolução das
Institutas indica, Calvino originalmente concebeu
a obra em termos modestos, sem qualquer pretensão à
abrangência metodológica. A reordenação do material,
entre as edições no período de 1536 a 1559, reflete
considerações mais pedagógicas que metodológicas. A
preocupação de Calvino é mais humanista que escolástica
– ajudar seus leitores, ao invés de impor-lhes um método
sobre o pensamento.
As
Institutas de 1559
combinam as virtudes cardeais da educação humanista –
clareza e compreensividade – permitindo a seus leitores
acesso a uma apresentação clara e completa dos
principais pontos da fé cristã, que Calvino desejava que
fossem entendidos. Em nenhum ponto há qualquer evidência
que sugira um princípio condutor, axioma ou doutrina –
exceto a clareza de apresentação – que governa a forma
ou a substância da obra.
A amplitude
do pensamento de Calvino
Não há uma doutrina central no
pensamento de Calvino. Podem-se localizar certos temas
nuclearmente importantes, certas metáforas fundamentais, mas
a noção de uma doutrina ou um axioma central que o
controle não pode ser sustentada. Não há um “núcleo”,
nem “princípio básico” ou “premissa central”, nenhuma
“essência” do pensamento teológico de Calvino. Todavia,
não se pode negar que um dos pilares do pensamento de
Calvino é o pressuposto da iniciativa e soberania
divinas. Todas as formulações teológicas de Calvino
emergem deste a priori.
Diferentemente do
que se pensa, não é a doutrina da predestinação que
prepondera e governa a soteriologia de Calvino, mas sim
o grande mistério da união mística com Cristo da qual,
aliás, o Novo Testamento fala com metáforas de profunda
intimidade, e que tem sido apontado com um dos temas
centrais em Calvino, talvez até a viga mestra de todo o
seu edifício teológico.
Ele construiu e deixou este grande legado à igreja,
especialmente pela sua apreciação aos textos originais.
João Calvino foi um exegeta notável, levando para si o
título de exegeta da Reforma, tornando-se o mais
importante modelo da aplicação do conteúdo
histórico-gramatical, criando um novo modelo
hermenêutico para a história da interpretação cristã.
A
força do pensamento de Calvino não está na sua
capacidade de expressar de modo claro, correto e
profundo o verdadeiro sentido das afirmações bíblicas. O pensamento teológico do pastor curador de almas
foi expresso com sua visão de teólogo e seu saber de
jurista, focada em honrar a Deus acima de todas as
coisas. Para ele as pessoas devem buscar a perfeição no
cotidiano da vida, honrando a Deus pelas contínuas
conquistas advindas do trabalho, pois a sua teologia é
aplicada à vida como um todo e para servir à sociedade
em geral.
Referências bibliográficas
O Pensamento de João Calvino – Editora Mackenzie
A vida de João Calvino – Editora Cultura Cristã –
Alister McGrath
Calvino, Genebra e a Reforma – Editora Cultura Cristã –
Ronald Wallace.
Diony
Henrique Dias
é
pastor da IPRB desde 30/11/2002.
Professor no Seminário
Presbiteriano Renovado Brasil Central, em Anápolis, GO
Detentor do prontuário número 1.140.
João Calvino é uma figura não só controversa, mas ainda
muito desconhecida e mal compreendida por muitos. Nesta
data importante para os calvinistas de todo o mundo, não
é exagero afirmar que a história da teologia pode ser
dividida em pré e pós João Calvino, devido ao seu legado
teológico. A abrangência e influência de seu pensamento
fazem dele um dos principais teólogos de todos os tempos
da Igreja Cristã.
Foi a mente brilhante de João Calvino que cristalizou a
Reforma Protestante. O calvinismo não foi um movimento
teológico passageiro. É impossível fazer teologia de
modo responsável sem interagir com o legado de Calvino.
O calvinismo é um modo completo de ver, entender e
existir; é um sistema que envolve todos os aspectos da
vida humana.
Embora a concepção popular do pensamento teológico de
Calvino seja a de um sistema rigorosamente lógico,
centrado sobre a doutrina da predestinação, isto não é
verdade. Falar de Calvino como um teólogo sistematizador
implica em um grau de afinidade com o escolasticismo
medieval que contradiz suas atitudes conhecidas. Também
sugere um deslocamento significativo entre Calvino e sua
cultura, que não percebeu que nenhuma razão particular para produzir obras de
“teologia sistemática” – um gênero literário que, de
qualquer modo, estava firmemente identificado com a
preservação do tão desprezado escolasticismo.
A obra teológica de Calvino
A obra magna da exposição do pensamento teológico de
João Calvino é conhecida pelo nome de As Institutas.
Em importância, influência e qualidade, essa obra não
possui rival na história da teologia. Ela poderia ser
comparada, talvez, à Cidade de Deus de Agostinho,
ou a Summa de Tomás de Aquino, possivelmente à Dogmática Eclesiástica de Karl Barth.
Entretanto, a todas essas a obra-prima de Calvino supera.
As
Institutas são um livro onde encontramos não apenas o melhor compêndio de teologia
cristã, segundo alguns teólogos, mas também a base de
uma cosmovisão cristã, cuja abrangência e consistência
são sem igual na história da igreja. Ele ainda produziu
comentários sobre quase todos os livros do Novo
Testamento (exceto 2 e 3 João e Apocalipse) e, no
Antigo, escreveu sobre o Pentateuco, Josué, Salmos e
sobre os profetas maiores e menores (Isaías e
Malaquias). A série Corpus Reformatorum contém
872 sermões de Calvino.
A biblioteca de Genebra possui
2035 desses sermões em manuscrito. Ele também publicou
folhetos e tratados com temas apologéticos (contra
católicos e anabatistas) e de assuntos gerais sobre a
Reforma da Igreja. Um dos mais conhecidos é o tratado
sobre a Ceia do Senhor (escrito quando estava em
Estrasburgo), em que combate os pontos de vista do
romanismo e do luteranismo e dá o seu próprio ponto de
vista sobre a ordenança.
Através de cartas se comunicou
com outros reformadores, soberanos, igrejas perseguidas
e protestantes encarcerados, pastores, colportores, e
outros.
Uma das mais famosas de suas cartas, além da que
prefacia a sua obra magna, dirigida ao rei Francisco I,
é sua resposta ao cardeal Sadoleto. Este ícone da
teologia cristã ainda produziu escritos litúrgicos e
catequéticos. Logo depois da 1ª edição das Institutas,
Calvino escreveu o seu primeiro “catecismo” a que deu o
nome de Instrução de Fé, em 1537, que verteu para o
francês em 1538. Em Genebra, escreveu também com outro
catecismo, ao qual deu o formato de catecismo mesmo,
hoje conhecido como o Catecismo de Genebra. Ali escreveu
também uma Confissão de Fé, livro de ordem litúrgica e
administração eclesiástica (disciplina), saltério, etc.
Pelo volume de seus escritos se percebe a profundidade
de seu pensamento. É certo que as Institutas,
obra publicada em sua versão final em 1559, têm sido
frequentemente comparadas às outras obras, com suas 512
questões, 2.669 artigos e mais de 10.000 objeções e
réplicas - em sua abrangência e influência. Mas isto é
confundir puro volume literário e influência histórica
com afinidade teológica.
Como um estudo da evolução das
Institutas indica, Calvino originalmente concebeu
a obra em termos modestos, sem qualquer pretensão à
abrangência metodológica. A reordenação do material,
entre as edições no período de 1536 a 1559, reflete
considerações mais pedagógicas que metodológicas. A
preocupação de Calvino é mais humanista que escolástica
– ajudar seus leitores, ao invés de impor-lhes um método
sobre o pensamento.
As
Institutas de 1559
combinam as virtudes cardeais da educação humanista –
clareza e compreensividade – permitindo a seus leitores
acesso a uma apresentação clara e completa dos
principais pontos da fé cristã, que Calvino desejava que
fossem entendidos. Em nenhum ponto há qualquer evidência
que sugira um princípio condutor, axioma ou doutrina –
exceto a clareza de apresentação – que governa a forma
ou a substância da obra.
A amplitude
do pensamento de Calvino
do pensamento de Calvino
Não há uma doutrina central no
pensamento de Calvino. Podem-se localizar certos temas
nuclearmente importantes, certas metáforas fundamentais, mas
a noção de uma doutrina ou um axioma central que o
controle não pode ser sustentada. Não há um “núcleo”,
nem “princípio básico” ou “premissa central”, nenhuma
“essência” do pensamento teológico de Calvino. Todavia,
não se pode negar que um dos pilares do pensamento de
Calvino é o pressuposto da iniciativa e soberania
divinas. Todas as formulações teológicas de Calvino
emergem deste a priori.
Diferentemente do
que se pensa, não é a doutrina da predestinação que
prepondera e governa a soteriologia de Calvino, mas sim
o grande mistério da união mística com Cristo da qual,
aliás, o Novo Testamento fala com metáforas de profunda
intimidade, e que tem sido apontado com um dos temas
centrais em Calvino, talvez até a viga mestra de todo o
seu edifício teológico.
Ele construiu e deixou este grande legado à igreja,
especialmente pela sua apreciação aos textos originais.
João Calvino foi um exegeta notável, levando para si o
título de exegeta da Reforma, tornando-se o mais
importante modelo da aplicação do conteúdo
histórico-gramatical, criando um novo modelo
hermenêutico para a história da interpretação cristã.
A
força do pensamento de Calvino não está na sua
capacidade de expressar de modo claro, correto e
profundo o verdadeiro sentido das afirmações bíblicas. O pensamento teológico do pastor curador de almas
foi expresso com sua visão de teólogo e seu saber de
jurista, focada em honrar a Deus acima de todas as
coisas. Para ele as pessoas devem buscar a perfeição no
cotidiano da vida, honrando a Deus pelas contínuas
conquistas advindas do trabalho, pois a sua teologia é
aplicada à vida como um todo e para servir à sociedade
em geral.
Referências bibliográficas
O Pensamento de João Calvino – Editora Mackenzie
A vida de João Calvino – Editora Cultura Cristã –
Alister McGrath
Calvino, Genebra e a Reforma – Editora Cultura Cristã –
Ronald Wallace.
Diony Henrique Dias
é pastor da IPRB desde 30/11/2002.
Professor no Seminário Presbiteriano Renovado Brasil Central, em Anápolis, GO
Detentor do prontuário número 1.140.
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